Filipe Fontes
2 min readMay 21, 2019

O ABRAÇO DE DEUS

Era dia de vacina. Talvez você não saiba o que isso significa. Se já é duro levar nossos filhos para esse momento quando bebês, com eles um pouco crescidinhos, o caminho se transforma, literalmente, numa “via crucis”.

Ontem percorri a via mais uma vez; eu e minha menina. Mamãe não estava conosco, e não faria nenhuma questão de estar. Enquanto eu caminhava, meu coração se apertava. Sobretudo quando percebia que para minha filhinha, ela estava apenas passeando com o papai, sem saber o que a aguardava. Numa escala infinitamente menor: sentimento de Abraão em direção ao Moriáh.

Tudo conforme o protocolo. Vacina paga, informações dadas, e as orientações da enfermeira sobre como segurar minha criança. Coração ainda mais apertado, quando sem qualquer reclamação ela se assentou de lado em meu colo, com as pernas entre as minhas, para que eu pudesse segurá-las. Com uma de minhas mãos segurei o seu braço, o da picada, e com o outro encostei em meu peito, o rosto que, insistentemente, desejava ver o que estava para acontecer. Ai!

Tudo conforme o protocolo: dor, choro, lágrima, e sofrimento…

No caminho de volta, já aliviados, talvez mais eu do que ela, resolvi interrogá-la sobre o que havia acontecido. Eu queria entender como ela, no auge de seus três anos de idade, tinha elaborado todo aquele momento. Há bem da verdade, eu queria saber mesmo, como ela compreendia o fato de que o papai, que deveria cuidar dela, tinha a levado e a segurado para que tudo acontecesse.

_Minha filha, o que você foi fazer no médico?

_Tomar vacina.

_Por que você tomou vacina?

_Pra não ficar dodói.

_ E você gostou de tomar vacina?

_Não.

_Por que, minha filha?

_Por que dói.

_E o papai, o que ele fez?

_ O papai foi comigo. Ele me abraçou!

Por pouco o choro não mudou de personagem! Embora não saiba bem o porquê, segurei as lágrimas. Entretanto, elas não seguraram a emoção do que aprendi com tão singela experiência: preciso cada dia mais de um coração de criança. Só um coração de criança percebe que o Pai que segura é o mesmo Pai que abraça!

Escrito em 2013, quando Ana Lívia, minha filha mais velha [a personagem da história], tinha 3 aninhos…